Artigo de opinião escrito pelo professor António Caselas

Habituamo-nos a ver explicitado e criticado o populismo de direita ou de extrema-direita. A ver referido o populismo de esquerda ligado a partidos que, por exemplo, em Espanha (aliado ao partido de extrema-direita de Salvini) e Itália (aliado ao Partido Socialista de Sanchez) chegaram ao poder governativo. E em Portugal associa-se o Bloco de Esquerda ou o Livre a esse tipo de orientação ideológica. Mas o que propõe verdadeiramente o populismo de ‘sinal contrário’? É menos perigoso do que o seu competidor? É tão ‘popular’ como ele? Propõe alguma coisa de positivo que possa contrapor ao populismo de direita?
Essas questões não iludem, porém, um facto. A sua expressão é menos significativa, quer na Europa, quer noutras regiões do planeta. As suas propostas, criticáveis ou benéficas, viáveis ou utópicas, construtivas ou meramente teóricas podem ser encontradas no livro da pensadora belga Chantal Mouffe, Por um populismo de esquerda. Mouffe pretende melhorar as democracias liberais. Torná-las mais justas. Na terminologia que usa, quer ‘radicalizar’ as democracias.
Sabemos que as propostas de melhoramento dos regimes democráticos liberais apresentadas pelo populismo de direita são, no mínimo, discutíveis. Mas o que pretende, verdadeiramente, o populismo de ‘esquerda’? Cumprir os ideais democráticos de justiça, social, liberdade e igualdade relativa. Mas isso exige medidas concretas e institucionais, uma reformulação dos regimes liberais. Será que as encontramos no texto de Mouffe as respostas que essa exigência impõe?
Não. Encontramos uma saída algo retórica: uma espécie de ‘acomodação discursiva’. Mouffe refere-se a uma ‘estratégia discursiva’. Mas, infelizmente, a eficácia da mesma é pouco provável.
Mais recentemente, Paul Mason retoma esse tipo de esclarecimento discursivo como forma de desmascarar os populismos de extrema-direita. Todos sabemos que isso não permite cumprir essa finalidade. Os apoiantes, eleitores ou simpatizantes desses movimentos e regimes dão pouca importância ao fundo das palavras; ficam-se pela superfície sobrepondo as motivações sujetivas à racionalidade política. Desprezam ou ignoram as incoerências e contradições. Veneram a propaganda e as fórmulas. Aquilo que comumente se designa de ‘frases feitas’. E, o que é mais desconcertante, seguem uma ‘cartilha’, quer esta tenha um conteúdo de direita, quer de esquerda.
Impõe-se, por isso, uma tarefa que, aparentemente, parece cada vez mais inglória: afastar ou menosprezar os extremismos em favor da moderação. Não esconder as falhas das democracias liberais, mas também não defender que elas se superam através da radicalização.
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