Artigo de opinião escrito pelo professor António Caselas

O ataque da administração Trump às universidades de elite (a designada Ivy League) não é uma novidade nem uma criação do chefe do movimento Maga. O facto dessas universidades ‘representarem’ as elites parece motivar o ataque. A Ohio State não pertence a essa ‘categoria’ e escapou à perseguição apesar de terem ocorrido na instituição protestos contra a política israelita.
A política de diversidade e pluralidade irrita também os apoiantes do presidente americano. A direita americana, através de vários senadores, empreendeu esse ataque em múltiplas ocasiões. Apesar de serem formados em universidades de elite (Ted Cruz, do Texas por Princeton e Harvard, Ron DeSantis, da Florida por Yale e Harvard, Tom Cotton, do Arkansas por Harvard, J. D. Vance (atual vice-presidente), do Ohio, por Yale e a congressista Elise Stefanik, por Harvard – muito ativa no ataque às representantes da academia, esses políticos perseguiram as universidades com acusações ideológicas, acusando-as de orientação esquerdista radical. Viram nos representantes das instituições perigosos instigadores de movimentos políticos marxistas e antissemitas.
É sabido que Trump recupera sobretudo a acusação de antissemitismo, mas na verdade pretende ele próprio controlar as instituições e interferir na lógica do seu funcionamento e nos conteúdos lecionados. Trata-se, inequivocamente, de uma intervenção ideológica imposta sob o pretexto de acusar os representantes institucionais de nada fazerem para evitar, por exemplo, os protestos estudantis contra a política de Israel e a sua ação em Gaza. As acusações vão mais longe e sugerem mesmo que os estudantes e as universidades defendem uma ação violenta contra Israel e contra a existência dos judeus. Independentemente de nada indiciar isso, o ataque agrava-se e generaliza-se.
Apesar de se focar ultimamente em Harvard está em causa um ataque político à autonomia universitária inscrito numa finalidade mais vasta de supressão da liberdade de expressão própria de regimes iliberais. A intolerância alastra e abrange publicações, livros e financiamento de organizações independentes. Trata-se de um combate ideológico semelhante ao que ocorreu no passado. Regimes fascistas e totalitários protagonizaram todo o tipo de abusos e violência contra a cultura e as formas de expressão independente e livre. O corte ou o condicionamento do financiamento a instituições situadas no estrangeiro e sujeitas a apoios dos Estados Unidos fazem parte dessa estratégia. Professores e estudantes são visados e lembram guerras culturais ‘revolucionárias’ que tiveram muito custos.
A tragédia da Revolução Cultural chinesa ainda assombra a memória recente. O extremismo ideológico quer impor-se alegando um combate a outro tipo de extremismo. A liberdade que caracterizou sempre a sociedade americana sofre um rude golpe. Aproveitando-se do seu poder, posição privilegiada e rede de contactos, os arautos da ideologia em busca de hegemonia procuram controlar política e ideologicamente o mundo da cultura.
Sabemos que existe um outro alvo igualmente sob ataque cerrado: as organizações e centros de investigação da Tecnociência. O caso da NASA é paradigmático. A chantagem e a ameaça de corte de financiamento são usadas como armas políticas. Não existem pruridos nem disfarces na publicitação dessas ameaças.
Trump e os seus apoiantes não são conhecidos pela subtileza das suas declarações e atos. O favorecimento do obscurantismo e da ignorância constitui, mais uma vez, uma revisitação do passado sombrio. A diversidade é esmagada pela visão monolítica que imperou nos fascismos e totalitarismos. Nos Estados Unidos, (para alguns, o país da liberdade e das oportunidades) a educação e a investigação estão a regredir dramaticamente.
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