Um texto escrito pelo professor António Caselas

Quem se interessar pela biografia de Hitler e não tiver tempo ou paciência para ler os extensos volumes de Peter Longerich, Ian Kershaw, Joachim Fest, Volker Ullrich ou Johann Chapoutot e Christian Ingrao (este menos volumoso) tem agora acesso a uma boa síntese, Hitler. Verdades e Lendas, de Claude Quétel (Editora Guerra e Paz).
A personagem do ditador ou tirano nazi e do seu regime inspiraram inúmeros estudos e pesquisas. Sem privilegiar os pormenores mais pitorescos podemos, de forma breve, sinalizar alguns pontos relevantes: o seu percurso ideológico, político e institucional. Pintor falhado, Hitler teve uma existência precária e miserável em Viena antes de se mudar para a Alemanha. O jovem Hitler alistou-se para combater na Primeira Guerra Mundial depois de algumas hesitações. Nunca passou de cabo e exerceu funções como estafeta. Nos julgamentos de Nuremberga quando perguntaram ao segundo-comandante do seu regimento por que razão Hitler nunca subiu de posto obtivemos a hilariante reposta: ‘Porque não possuía nenhuma das qualidades necessárias para ser líder’.
Porém, o seu fanatismo e eloquência (a par do recurso a técnicas de dramatização e propaganda) fizeram dele um chefe carismático de massas. Apesar da eloquência, o perfil medíocre de Hitler e as suas limitadas capacidades intelectuais foram assinalados desde cedo. A leitura (penosa) do seu livro Mein Kampft demonstra isso. Das páginas toscamente ‘impressionistas’, aborrecidas e, até, algo ‘infantis’ destaca-se o capítulo XI vagamente ‘teórico’ que é o centro do seu anti-semitismo. A sua mentalidade política foi rudemente esculpida nos seus anos de miserável deambulação por Viena durante os anos de juventude. Esse modo de pensar aproximou-o desde logo da orientação völkisch (que se poderia traduzir por orientação ‘doutrinária’ ‘etnonacionalpopulista’).
Em termos políticos Hitler soube manobrar nos bastidores do poder até se tornar (também devido à ascensão eleitoral do partido nazi) Chanceler. Foi, precisamente, devido à sua notória mediocridade que os atores políticos da época se achavam capazes de o manipular, mas enganaram-se. Tal como sucedeu com outros dirigentes nazis, Hitler aproximou-se sempre de extremistas, pangermanistas e racistas. No âmago do nazismo está a obsessão pela pureza da raça e pela suposta superioridade do povo alemão a todos os níveis – erigidos a partir do pressuposto biológico. E
ssa ‘linha de pensamento’ manifestou-se antes dos anos 20, e isso contraria, de facto, a ingénua e errada ideia de que a exterminação dos judeus teve uma motivação económico-financeira. O nazismo baseou-se no racismo, na irracionalidade, crueldade e na violência que conduziu ao extermínio. Os judeus foram o bode expiatório e o contexto foi a suposta humilhação da Alemanha no rescaldo da Primeira Guerra Mundial, aliada à crise de 1929. A crise produziu milhões de desempregados e muitos outros que receavam vir a engrossar essa lista e confiaram em Hitler. Afundaram-se com ele e só sobreviveram porque o seu führer não conseguiu o seu intento final: o colapso total e irremediável da Alemanha e do seu povo.
Se os alemães querem voltar a trilhar esse caminho só o tempo dirá. Depois do Império Romano, o nazismo foi a tentativa de impor à Europa e ao mundo um ‘reino’. Foi um projeto expansionista extremista que tentou criar um império de governo mundial.
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