Artigo de opinião escrito pelo professor António Caselas

Os maiores pensadores da antiguidade, Platão e Aristóteles, afastaram-se do ideal político democrático alegando a sua medianidade e mediocridade. O governo do povo corre sempre o risco de desiludir e não corresponder aos seus próprios ensaios. Essa ‘sentença’, por muito polémica que seja, surge no presente como verdadeira e legitimada pela reatualização do populismo.
Hobbes escreveu, «o povo não pensa». A questão é que a legitimação política minoritária abre a porta a todas as arbitrariedades e iniquidades. Para erros e falhas maiores. O governo de um só ou de alguns que não foram eleitos não é aceitável para aqueles que viram o planeta assolado por múltiplas e diversificadas ditaduras e tiranias sangrentas. O que os pensadores ancestrais não previram foi que a democracia cria as condições para a sua destruição, para a sua autodestruição.
O desrespeito pelo que se encontra consignado em leis fundamentais e princípios constitucionais não é respeitado: ideologias extremistas e declaradamente antidemocráticas são legalizadas. Movimentos, partidos e orientações políticas neofascistas e neonazis são legalizadas e normalizadas. Demagogos que atentaram contra as instituições democráticas são admitidos como candidatos a eleições. Os que instigaram golpes são autorizados a competirem na cena demo-parlamentar em condições de paridade com líderes democráticos e que nada fizeram para minimizar e destruir a ordem constitucional.
Os seus apoiantes ou simpatizantes alegam que se trata da lógica da própria democracia, mas esquecem que essa admissão e normalização contraria as normas constitucionais básicas. Ou se altera a ordem de legitimação política ou se retira a possibilidade de normalização de forças antidemocráticas. O meio termo é uma zona cinzenta que contraria a legalidade democrática, a esvazia ou perverte. Relega-a para um espaço caricatural ou indiferenciado onde cabe tudo. E um espaço político-institucional onde cabe tudo não tem qualquer utilidade prática. Uma zona de mediania pode transformar-se em algo muito pior, numa zona de insanáveis contradições e incoerências.
Na ausência de coragem para sanar à partida, as ideologias extremistas, a quebra da normalização deveria seguir um critério prático ou práxico: todos aqueles, partidos ou individualidades que revelaram, através da sua ação, uma propensão para a descredibilização ou para o ataque de instituições, valores e princípios democráticos devem ser afastados e impedidos de aceder ao jogo da competição democrática.
O risco maior é sempre condescender e a consequência é contribuir direta ou indiretamente para a destruição da democracia. Há uma coragem que nunca se pode ausentar: se os inimigos da democracia entrarem pela porta devem ser expulsos sem hesitações e nunca autorizados a que, mais tarde, possam entrar pela janela.
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