Artigo de opinião escrito pelo Professor António Caselas, AE de Santa Catarina
Há vários meses que se fala de Orçamento do Estado. Da sua aprovação depende a continuação do governo. Se o orçamento não for aprovado será realizado um novo ato eleitoral poucos meses depois do que permitiu eleger o governo da AD.
O PS, principal partido da oposição, esteve muito tempo sem clarificar se iria viabilizar o orçamento e a continuação do atual governo. Só o fez recentemente depois de várias confusões e equívocos. Mas terá sentido fazer depender a continuação de um governo da aprovação do orçamento?
Só se o orçamento fosse um documento rigoroso e objetivo. Mas um orçamento estabelece uma previsão raramente fiável e rigorosa. O documento pode ser desvirtuado através de decisões concretas do governo ou do próprio Parlamento. E pode ser substancialmente alterado devido a contextos económico-financeiros, comerciais, políticos internos e externos. Pode ser revisto e retificado. E o mais grave é que pode ser pervertido ou não cumprido.
Nesse caso, por que razão se dá essa importância essencial a um tal documento? Talvez por razões meramente legais ou burocráticas. Sem uma previsão orçamental (pouco falível) o governo terá de exercer a sua ação por via de duodécimos e não poderá tomar decisões estratégicas e decidir o curso de financiamentos de grande impacto. O essencial parece depender, assim, de uma previsão meramente formal.
Os governos, no passado, habituaram-nos a desencaminhar o que se previa e que fazia parte da letra do orçamento. Mas a execução do orçamento é sempre estabelecida pelas orientações que o governo entende seguir e que, muitas vezes, tem de se adequar a variáveis não previstas. Tem que se ajustar a surpresas desagradáveis ou mesmo inesperadamente favoráveis à sua ação.
Como se sabe, a ciência económica e a ciência política dependem de inúmeras variáveis e contextos. Acontecimentos geopolíticos podem determinar a falência das previsões. Se isso sucede, o mais correto seria, talvez, estabelecer uma previsão minimalista. Inserir margens de incerteza e de improbabilidade. Deveria ser um documento quântico e não supostamente rigoroso que determina as receitas e despesas. Fazer depender a continuação da ação governativa da aprovação de um documento desse tipo é, por isso, discutível.